quarta-feira, 2 de junho de 2010

OTACÍLIO

Quem além de mim conviveria harmoniosamente com um gato canalha, chamado Pavarotti?
Malemolente, curioso, sempre pronto a dar palpites, mesmo sem ser consultado
Boêmio, piegas, adora ouvir música comigo e tomar sol na mesa verde da sacada. Faz greve de fome para impor o seu ponto de vista e provavelmente vai disputar com unhas e dentes uma vaguinha no meu caixão. Seremos juntos um só defunto!
Siamês de origem, brasileiro por convicção, um gato chato de galochas, primo distante do gato-de- botas.
Apesar de sua teimosia implicante, é sempre o meu melhor companheiro das madrugadas. Enquanto
escrevo compulsivamente ele me observa com o canto dos olhos puxados, azuis, semicerrados. Finge estar dormindo, mas basta um movimento meu para que emita a sua opinião sem ser chamado.
É público da minha primeira audição, leio meus trabalhos e ele escuta com  a atenção de uma coruja pós-graduada.
Às vezes em ataques Shakespearenos chamo-o de "Otacílio". Ele como um bom neurótico em crise de identidade me atende.
Nessas horas eu penso que talvez esteja tendo uma iluminação sobre as suas outras seis vidas. Quem sabe ele não foi um Otacílio qualquer?
Poeta, boêmio, sentado em uma mesa de  um bar de uma cidade qualquer, abandonado, desejando uma companhia para as suas longas madrugadas de solidão.
Pensando nisto entendo perfeitamente o seu interesse quase hipnótico pela lua.




texto do livro Para Um Homem Chamado Silêncio - Liane Flores - direitos reservados
                                                                                                                            
E o galo já cantou!

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